terça-feira, 27 de maio de 2008

O modelo dos heróis


O que a ética de Homero propõe é o cultivo de um modelo, a do Homem Perfeito, o Homem de Bronze. Um ser raro que não se guia pela lei comum nem é obediente ao convencional; é o fora de série que não somente se sobressai entre os demais como faz ele mesmo as regras que pretende seguir. Não são os carneiros balindo em rebanho quem o inspiram, mas sim a solidão altiva do lobo e a bravura o leão. É um herói que, mesmo sem qualquer amparo dos deuses, deve responder sozinho aos desafios que surgem e vingar as desonras que por acaso o submetem. Ele é superior. Recebeu uma herança honrada, de escol, a qual precisa manter imaculada, sem as manchas da covardia e da deserção.(*)
O seu esforço era ampliar o nome herdado por meio de uma fama ainda maior dos que o antecederam. De estatura elevada, de notável vigor físico, belo, destro com as armas e com os cavalos, varonil, ágil e astuto, partilhando os despojos de guerra com os amigos, piedoso para com deuses e implacável para com os inimigos, servia como exemplo a todos. Devia sempre considerar que era melhor conquistar a celebridade numa só ação, numa proeza impressionante, ainda que correndo perigos mil, do que deixar correr o restante da vida sem um brilho, sem um feito, sem nada. Preferível viver pouco deixando legenda, como foi o caso de Aquiles, do que muito tempo e não ser ninguém. (**) Todos os demais cavaleiros deviam segui-lo nessa decisão. As gerações que se sucedem teriam sempre o seu nome na lembrança, invocando-o em meio à batalha, inspirando-se nos feitos de outrora. Essa era a verdadeira imortalidade que um herói poderia almejar. Jamais ele seria apagado da memória dos seus e na de todos os que o sucederão pelas idades ainda por vir.
(*) Nietzsche, filósofo contemporâneo, iria fazer reviver esse ethos aristocrático na construção do super-homem, o que estará "acima do bem e do mal", olhando com desprezo os vencidos e os fracos (ver "Assim Falou Zaratustra", 1883)
(**) "Quem está impregnado de estima própria antes quer viver em breve espaço no mais alto gozo que passar uma longa existência em indolente repouso; prefere viver um ano só por um fim nobre que uma larga vida por nada; escolhe antes escutar uma única ação grande e magnífica, a fazer uma série de pequenas insignificâncias."

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